Difícil avaliar quais as chances que o romance de Scliar tem para ganhar o prêmio. Embora o critério de seleção seja a qualidade do livro, sabemos que tem maior peso no julgamento a qualidade da tradução. Ou seja, mais da metade da responsabilidade está nas mãos de Thomas O. Beebee (renomado professor de literatura comparada e alemão na Universidade Penn State). Ainda temos de considerar dois pontos importantes: a) também estão concorrendo traduções de romances escritos por Amos Oz, Juan José Saer, Jean-Philippe Toussaint e Enrique Vila-Matas - para citar os nomes mais conhecidos; b) traduções do sérvio, norueguês, húngaro, sueco, polonês e hebraico levam uma pequena vantagem sobre as línguas mais usualmente faladas como francês, espanhol, italiano e alemão pelo grau de complexidade daquelas línguas e dificuldade de encontrar um tradutor (não tenho a menor ideia de como é o mercado de tradução norte-americano, mas tomando como base o Brasil quantos tradutores de húngaro você conhece?).
No que depender de Moacyr Scliar temos muitas chances. Li uma resenha sobre o livro e parece deliciosamente cheio de brincadeiras com a história, a literatura e a vida. Como resume o tradutor Thomas O. Beebee: "O romance de Scliar aborda temas da história brasileira e européia, escrita judaica, as viagens da literatura e uma questão fundamental da leitura: como julgar a correção ou incorreção de uma interpretação literária". Vamos cruzar os dedos! Levando o prêmio, projetamos um pouco da nossa literatura no mundo e fazemos jus a memória de um grande escritor que faleceu em março do ano passado, infelizmente.
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Achei curioso descobrir que não existem prêmios de tradução de ficção tão tradicionais ou antigos quanto o Nobel, o Man Booker Prize, o Pulitzer e o Goncourt, por exemplo. Parece que no campo da tradução de poesia existem prêmios desde 1940 (ou até mais antigo). Imagino que deve ser por causa da especificidade do trabalho, afinal a nossa língua só diz respeito ao nosso próprio país ou aos falantes dela no mundo. Não tem como criar um prêmio internacional para isso. Solução: cada país deveria ter um prêmio importante do gênero já que a uma figura tão amada quanto odiado como o tradutor ("tradutor - traidor") pode ajudar ou prejudicar uma obra-prima.
O Best Translated Book Award pelo qual Scliar está concorrendo, por exemplo, foi criado em 2008. O prêmio para tradução mais antigo que encontrei chama Tchernichovsky Prize e foi criado em 1942 para traduções feitas para o hebraico.
No Brasil temos três prêmios conhecidos para tradução de ficção: APCA, Jabuti e Academia Brasileira de Letras. O prêmio da APCA foi criado em 1956, ganhou uma categoria específica para premiar literatura em 1972 e somente em 1974 contemplou o trabalho dos tradutores. Naquele ano ganhou Davi Arrigucci Junior pela tradução de Prosa de observatório, de Julio Cortazar. O Prêmio Jabuti foi criado em 1959, mas criou a categoria tradução somente em 1979 - premiando o livro Verso, reverso, controverso com traduções de Augusto de Campos para poemas dos trovadores provençais. A ABL criou recentemente um prêmio para tradução - o site não informa ao certo o ano, mas parece que foi depois do ano 2000.
Prêmios trazem prestígio ao trabalho do tradutor e ajudam a regulamentar o mercado que anda super aquecido por aqui. Quem sabe algum outro prêmio não esteja a caminho?
*P.S.: caso eu tenha praticado alguma incorreção ou tenha esquecido algum prêmio, por favor, escrevam nos comentários.
*P.S.2: como lembrou a Denise Bottman nos comentários, temos também o Prêmio Paulo Ranói de Tradução, organizado pela Fundação Biblioteca Nacional. Foi criado em 1995.
*imagem: reprodução de capa do livro de Moacyr Scliar em português e inglês.
*imagem: reprodução de capa do livro de Moacyr Scliar em português e inglês.