sexta-feira, 26 de agosto de 2011

TRANSMISSÃO: TOM MCCARTHY


Tom McCarthy é um escritor ainda inédito por aqui. Nenhum de seus livros ganhou tradução, seus contos não apareceram em nenhuma revista e ele também não concedeu nenhuma entrevista. Seja como for parece que estamos perdendo senão um grande nome da literatura contemporânea, pelo menos uma pessoa bastante interessada em teorizar sobre romances (ou sobre literatura).

O escritor foi convidado para a edição desse ano do Festival Literário Internacional de Edimburgo - um festival bastante curioso que por conta do verão dura 17 dias e tem muitas atrações. Ele participou de uma mesa intitulada "Noise, signal and word: how writing works" (em tradução livre "Ruído, sinal e palavra: como funciona a escrita") para explicar algumas de suas ideias sobre a figura do autor na literatura.

(Infelizmente o Festival não tem transmissão online das mesas e também não guardou nenhum arquivo em vídeo dessa apresentação. O que eu sei li na cobertura do jornal Guardian. Foi de lá que tirei um resumo das coisas que Tom McCarthy falou nessa mesa.)

Pegando carona nos temas que estão no romance C (um romance ambientado em pleno começo do século XX quando os grandes meios de comunicação sem fio estavam sendo inventados), Tom McCarthy propôs ideias para demonstrar que a literatura não tem autor. Para ele, escrever não é um ato de auto-expressão, nem uma maneira de compartilhar nossos sentimentos. A escrita é apenas transmissão da linguagem que fala por nós. Assim, os livros nada mais são do que "câmaras de eco" (lugares em que ecoam a linguagem que nos ronda). Consequentemente, os melhores livros são aqueles que conseguem sintonizar a linguagem e os pensamentos que estão espalhados por ai.

Para ilustrar essa apresentação, McCarthy falou sobre o mito de Orfeu em Ovídio, Rainer Maria Rilke e mostrou um trecho do filme Orfeu, de Jean Cocteau (1949). Nesse filme, Orfeu vive as voltas com um rádio de carro que sintoniza sempre vozes transmitidas por um poeta do além. São mensagens cifradas que lembram códigos. McCarthy também mostrou a música Antenna, da banda Kraftwerk. Ela está no disco Radio-Activity (1975) repleto de temas ligados a rádios, energia nuclear, ondas sonoras, transmissões e antenas. A letra minimalista de Antenna diz o seguinte: "I'm the antenna catching vibration/ You're the transmitter give information/ I'm the transmitter I give information / You're the antenna catching vibration".

Não é a primeira vez que essas ideias circulam no meio literário. Nos anos 50 os estruturalistas franceses já falavam disso - Roland Barthes foi um dos primeiros a teorizar sobre a morte do autor. Toda a turma do Nouveau Roman (Alain Robbe Grillet, Nathalie Sarraute, Michel Butor, Marguerite Duras, Claude Simon) construiu sua obra a partir desse caminho. O pessoal do OuLiPo também. No entanto não deixa de ser interessante o fato de um escritor do nosso tempo voltar a essas ideias para usá-las como tema de seu processo de escrita - não digo como forma, já que ele não está experimentando com a linguagem, nem apagando categorias narrativas. É como se McCarthy esteve se esforçando para chamar nossa atenção ao retorno natural que o romance e a literatura podem tomar - fazer da inovação uma tradição e recuperar isso tudo com um novo olhar. Dessa forma, quem sabe, a gente não pode encontrar uma solução para a angústia de ter de sempre superar o que esteve atrás de nós.

Em tempo, Tom McCarthy já está trabalhando num novo romance que vai ser sobre poluição e meio ambiente. Quem quiser ler os romances já publicados por ele, pode recorrer a tradução portuguesa ou encarar as edições inglesas - diretamente do original.

*imagem: reprodução daqui.


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